terça-feira, 17 de maio de 2016

1984 na UERJ de 2015


Imagine a seguinte cena: você vive em uma sociedade que te vigia constantemente. O seu país vive em guerra constante: ora contra o Leste, ora contra o Oeste. O seu governo opta, às vezes, por uma reforma ortográfica: pra que a palavra “ótimo” quando “pluribom” pode dizer a mesma coisa? Enfim, você vive aí e tem um nome ordinário qualquer, como “John Smith”. E por mais amizades que você tenha, pior pra você, afinal maior a sua desconfiança em relação a tudo e todos. A isso hoje nós damos o nome de “distopia”: o desenho de um futuro cruel e sombrio para a humanidade. O George Orwell, em 1948, nos imaginou assim em 1984.

DISTOPIA É HOJE
Bom, você já deve saber que 1984 é um livro clássico. E o que isso significa? Bem, lá eu vou citar Ítalo Calvino mais uma vez. Clássicos trazem um enxame de interpretações sobre si mesmo. Isso exige reconhecer que o valor desse livro está na capacidade que ele tem de não parar de dizer o que ele tem pra dizer. Confuso? Não, a coisa é bem simples. Hoje em dia você ainda DEVE ler 1984 porque ele diz muito sobre o nosso contemporâneo, ou seja, ele é um livro que transcende o contexto histórico no qual foi escrito. 

Já que estamos no território das interpretações, seria interessante chamar a atenção para o diálogo que 1984 estabelece com as categorias de outras áreas do saber. Vou dar um exemplo: o tal do “Big Brother”, que já foi devidamente vulgarizado como reality show, pode ser lido como um panóptico: isto é, a sua função é controlar e moderar as pessoas, certo? Sendo assim, ele é um elemento técnico fundamental para a manutenção de uma sociedade do controle: ele dissocia o “ver-do-ser-visto”, ou seja, ele adestra, disciplina e domestica de maneira quase invisível. Oras, não é justamente isso que os nossos smartphones fazem conosco? E o curioso é que o fazem com a nossa aprovação e estímulo... 
Um outro exemplo: você vai ler o livro e perceber que constantemente as notícias são reescritas, e que as chamadas mídias, ou seja, os meios de comunicação eles literalmente fabricam e manipulam os eventos e fatos históricos de modo que causa uma sensação de desorientação na população, um certo mal-estar social, afinal você nunca sabe muito bem quem é o seu inimigo ou de que lado você e sua sociedade estão... Oras, não é justamente isso que as redes sociais, de certa forma, nos provocam?
Bem, você pode achar que estou forçando a barra... Então, vamos fazer o seguinte: vamos pra questão 59 DA UERJ DE 2015 realizada no dia 08/06/2014 e depois eu justifico o meu roteiro. Como você pode notar, é uma questão acessível, e fácil para quem conhece a obra. A alternativa correta é a “letra D” porque estamos tratando de regime político, de forma de governo. Que, aliás, foi uma manifestação que ocorreu tanto no capitalismo quanto no socialismo...

TÉCNICA E BIOPODER
Pra gente fechar, eu vou retomar meu raciocínio: como eu disse, é possível traçar alguns paralelos entre o livro e nosso contemporâneo. Faz o seguinte: troca a política por tecnologia, e veja se o livro ainda funciona. Pois é, se ontem, nos anos 1950 o terror social era alimentado por um Estado forte, esse terror hoje está dissolvido entre os nossos aparatos tecnológicos: smartphones são pequenos big brothers: eles nos rastreiam em qualquer lugar. Googles, Facebooks, Amazons também podem ser lidas assim: com seus bigdatas, elas nos estimulam constantemente ao consumo, nos reduzem às bolhas de opiniões com seus algoritmos e, então, são capazes de camuflar certas condicionantes econômicas e políticas para que a gente assuma certos fatos e comportamentos como normais e naturais.
Percebe como as tecnologias podem assumir um caráter fascista? E como as mercadorias podem instrumentalizar e funcionalizar os nossos comportamentos? Mas que fique claro, o problema não é a tecnologia e a mercadoria em si mesmas, mas o “fator humano” que as modera e as controla. Como você faz pra lidar com elas? Oras, continue lendo e estudando. De preferência, os clássicos.
 Abraços e até a próxima!

Profábio

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