Me diz uma
coisa: você se considera um estudante importante para a sua turma? É, isto
mesmo: você se preocupa com o bem-estar de sua turma, de sua escola? Imagino
que sim, mas por que você procura alegrar o convívio escolar e torná-lo mais
agradável? Seria por que você gosta de fazer amigos simplesmente pela amizade
em si mesma? Bem, você se considera uma pessoa útil porque participa da aula,
porque polemiza, monta grupos de estudos e busca sempre o melhor rendimento
escolar, mesmo que isto te custe algumas amizades? (FILME) Bem, esse será o
nosso tema de hoje: ética na Unesp.
UTILIDADE É EFEITO
A prova de
Humanas da UNESP tem o costume de flertar com uma linha de pensamento que se
costuma chamar de liberal conservative,
isto é, com uma tradição de pensamento liberal que busca defender a individualidade
como um valor social levando em conta os seus efeitos sociais. Explico: o que
importa para os liberais conservadores,
digamos que é justamente a conservação da capacidade do indivíduo de se virar
por conta própria, ou seja, de ele adquirir resiliência, resistência e competência
para ser uma pessoa útil, produtiva e capaz de oferecer bons serviços e
produtos.
E uma tradução desse raciocínio se
encontra no utilitarismo, uma ética fundada pelos ingleses Jeremy Bentham e
John Mill em meados do século 19. Dentre as intenções desses ingleses, estava a
aliança de uma filosofia moral com uma filosofia política, ou melhor dizendo, para
eles, o debate a respeito da ética e da moral deveria envolver questões
empíricas, práticas, concretas.
Sendo
assim, o indivíduo se torna ético se, de fato, ele traz alguma contribuição
social, se ele realmente é um sujeito eficaz, ou seja, se ele sabe se valer do
seu tempo e dedicação privados com a intenção de melhorar a vida dos demais.
Bem, você
já deve ter percebido que a ética utilitarista, então, traz uma grande inovação
histórica: o que importa não é consciência de certo ou errado ou qualquer
bobagem metafísica: o que está em jogo é a finalidade de suas ações, a
consequência de seus atos, ou seja, se você decide ser uma pessoa utilitarista,
você está pensando em profits and
benefits. Assim, a vida se torna, então, uma questão de cálculos estratégicos,
conforme podemos ver na questão
57 da prova de meio de ano da UNESP de 2014.
Como você
pode notar, a UNESP traz a citação da revista VEJA, uma revista semanal de
grande circulação nos setores médios da sociedade brasileira. E como que
ecoando, reverberando o discurso da revista, a UNESP reconhece logo de cara um
importante valor político: a defesa da propriedade privada. Oras, apesar das
possíveis boas intenções dos ativistas pró-animais, a propriedade privada é um valor
inviolável. Um segundo ponto nos interessa: diante do apelo emocional que os
cães nos provocam, fica a pergunta: vocês preferem beagles ou avanço científico?
Já que tudo nessa vida tem um preço, quantos snoopys custa um medicamento? E
isto nos leva a LETRA A como alternativa correta, porque ela reconhece o
problema ético proposto pelo enunciado. Vejamos as outras alternativas:
ü A “LETRA B” não poderia ser porque o
debate a questão é eminentemente laica;
ü Não poderia ser a “LETRA C” porque o
problema enunciado é de ordem científica e econômica.
ü A “LETRA D” até que oferece uma mancha
de óleo para aqueles que praticam uma leitura desatenta, mas o problema da propriedade
já está resolvido no enunciado: depredação é crime. Agora, restam os beagles...
ü A “LETRA E”... é o canto de sereia dos
desavisados, afinal sim a questão trata dos interesses da indústria
farmacêutica, porém não é só isto, envolve primeiro a sua dimensão ética;
PRAZER É O BEM GERAL
Como se vê,
a questão da UNESP parece nos oferecer um dilema moral: temos a sensação de
ficar entre a comoção pela defesa da vida suprema dos pelos cães – que,
convenhamos, bate em cheio no peito da classe média que adora “pets” - e a escolha
pela medicina, pelo avanço científico que, em teoria, geraria um bem maior.
Porém, para
um bom utilitarista, isso não chega a ser um dilema e sequer um problema social:
afinal, se as nossas decisões morais devem estar relacionadas com a finalidade
das nossas atitudes, o que importa é ser uma pessoa útil, consequente e preocupado
no bem-estar do maior número possível de pessoas.
Bom, devo
dizer que a tentação aqui é grande: traduzindo, é como se os utilitaristas fossem
os partidários de uma grande campanha pela vida: cada um cuida da sua, de
maneira a tornar o convívio social melhor, mais tolerante e produtivo.
Abraços e
até a próxima!
Profábio
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