quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

A FUVEST E ANTONIL

A FUVEST E ANTONIL

O Brasil é o "inferno dos negros, o purgatório dos brancos e paraíso dos mulatos e das mulatas". Essas são as palavras do jesuíta italiano João Antônio, mais conhecido como André João Antonil, que esteve por aqui no século 17 e nos deixou um poderoso retrato do cotidiano da nossa sociedade açucareira. E pra gente entrar no clima do brasil colonial. Pois é, essa é uma das obras-primas do grande Vladimir Carvalho realizada em 1969 e que vai nos acompanhar em nosso passeio pela FUVEST de 2015.

ANGU, FEIJÃO E COUVE
Os escritos do jesuíta Antonil são frequentes nos manuais de vestibulares, afinal o seu livro “Cultura e populência do Brasil por suas drogas e minas”, publicado em 1711, é um excelente retrato do cotidiano de um brasil colonial que via as pedras preciosas das minas gerais assumirem o protagonismo econômico que um dia havia sido da produção açucareira nordestina.
Bem, eu tive a felicidade de estudar História na UFOP. Morei em Mariana, que foi fundada em 1969 e entrou para a história como sendo a primeira vila e a primeira cidade das Minas Gerais. Sim, claro: também frequentei Ouro Preto com ladeiras sem fim e suas ‘trocentas’ igrejas reluzentes. O Antonil também passou por lá nos idos de 1700 e achou bastante curioso o fato de as pessoas terem o hábito de comerem angu, feijão e couve. E passados 300 anos, esteja certo de que você ainda vai encontrar essas delícias por lá.
Outra expressão bastante frequente de Antonil nos manuais didáticos diz respeito à escravidão quando ele diz que os “escravos são as mãos e os pés dos senhores”. Então, que tal voltar ao filme para se ter uma ideia do aroma do engenho? 
Bem, o historiador Boris Fausto concordaria com ele ao demonstrar que, se em 1570, os africanos representavam cerca de 7% da mão de obra na zona açucareira, já em 1590, eles eram 37% da mão de obra. E se tornariam a totalidade da força de trabalho já na década de 1640.
Como você pode perceber, esse pupilo do padre Antônio Vieira também foi um historiador bastante atento às condições do seu tempo presente, de maneira que esse seu livro chegou a ser proibido de circular, já que a Coroa acreditava que ele poderia chamar a atenção de seus rivais colonizadores. Porém, mais uma vez, a literatura venceu a política, e eis o texto aqui na questão 06 da prova da FUVEST de 2015

Como você pode notar, o recorte do Antonil valoriza uma economia intermediária entre o açúcar e o ouro das Minas Gerais: o fumo.  Essa economia foi a segunda maior atividade destinada à exportação depois do açúcar e, em grande parte, esteve nas mãos de pequenos proprietários localizados no recôncavo baiano. E ali se produziu os mais diversos tipos de fumo, dos mais refinados para o mercado europeu aos mais grosseiros destinados ao comércio de cativos na África. Bem, dado esse cenário, vamos às alternativas:
ü  A LETRA A não seria adequada porque a economia do tabaco não configura um “ciclo” econômico; ela foi uma atividade periférica que abasteceu o mercado interno;
ü  A LETRA B também não é adequada pelo mesmo motivo: o importante aqui é reconhecer que a FUVEST exige do candidato a sensibilidade de perceber as dinâmicas econômicas internas da colônia, aquelas que escapavam do chamado “pacto colonial’;
ü  A LETRA C está fora de cogitação, afinal mesmo no auge da produção de ouro, estamos em 1760, a produção de açúcar atingia 50% do total das exportações.
ü  A LETRA D não atende às exigências do enunciado, primeiro porque o nosso foco é a economia do tabaco. E depois porque você sabe que é justamente nesse momento, por volta dos 1700, que estamos definitivamente rompendo as linhas do tratado de Tordesilhas junto com os bandeirantes;
ü  Assim, A LETRA E responde a questão porque demonstra a particularidade da economia do tabaco: ela foi importante não só porque foi exportada pelo mundo afora, mas também porque contribui para o desenvolvimento das atividades pecuárias e, assim, para a consolidação de um mercado interno;

CULTURA E OPULÊNCIA
Para encerrar, vale chamar a atenção para o fato de a FUVEST trabalhar com citações de clássicos, isto é, além de apresentar estudos de acadêmicos renomados, algumas vezes ela apresenta documentos históricos que permitem ao candidato o convívio direto com o que nós historiadores também chamamos de fontes primárias.
Nesse sentido, também vale a pena chamar a atenção para o fato da FUVEST fugir dos velhos esquemas “metrópole-colônia” e enfatizar a diversidade econômica do brasil colonial, ou seja, valorizar as dinâmicas econômicas internas e as riquezas da realidade histórica de nossa história colonial.
Abraços e até a próxima!

Profábio

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